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14/12/2009 |
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Edição Nº 1114 de 14 a 19 dezembro de 2009 |
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| ARTIGO |
Economia a serviço da vida? |
Após um bom tempo em baixa, a Campanha da Fraternidade do próximo ano, "Economia e vida", está colocando de novo a relação entre a fé cristã e economia nas programações. Nesses debates e reflexões, é comum ouvirmos a tese de que a "economia deve estar a serviço da vida". Essa proposta de uma "economia a serviço da vida" é potencialmente mobilizadora e catalisadora de movimentos sociais e eclesiais na luta contra as injustiças sociais, exclusão social e outros problemas sociais de origem econômica. Por isso, eu penso que merece uma reflexão.
A idéia de economia a serviço da vida se contrapõe à economia capitalista que está em função e é dirigida pelo objetivo supremo da maximização do lucro. Neste sentido, é um lema que revela o lado crítico frente à atual sistema econômico dominante no mundo. Porém, reconhecendo essa dimensão profética do lema, eu penso que pode surgir também um efeito não-intencional que pode nos levar a equívocos práticos.
No caso específico dos seres humanos, a vida humana é produzida e reproduzida continuamente através do trabalho que retira da "natureza" os meios necessários para a sua reprodução, como alimentos, bebidas, proteção contra a intempérie (roupas, casas, aquecimento em lugares muito frios etc) e outros bens. É claro que hoje em dia nem todos humanos trabalham diretamente na produção desses bens materiais. Muitos trabalham de modo indireto, outros na produção de serviços (como educação, saúde, segurança, etc.) e de bens simbólicos, e outros vivem à custa dos trabalhos alheios. Mas, a sociedade como um todo precisa prover esses bens para a sua população. E para isso organiza e impõe um sistema econômico onde os trabalhos são divididos e articulados em uma divisão social do trabalho.
Divisão social do trabalho, a sua coordenação, a produção e distribuição dos bens materiais e simbólicos necessários para a reprodução da vida e coisas assim compõe o campo da economia. E a economia é o campo onde se articulam o conjunto de relações sociais e de produção que lida com os recursos escassos para a produção da vida. O problema das teorias econômicas neoclássica e/ou a neoliberal (as que ainda dominam a discussão hoje) é que define a ciência econômica como uma ciência que busca a otimização do uso dos recursos econômicos para a obtenção de um fim econômico (o lucro) e não para a reprodução da vida de todos e todas.
A proposta de "economia a serviço da vida" tem a qualidade de criticar a economia capitalista atual que está organizada, não para a reprodução da vida digna para toda a coletividade, mas para a obtenção do lucro máximo. Mas, corre o risco de produzir o efeito não-intencional de continuar alimentando a idéia equivocada de que podemos lutar pela defesa da vida de toda humanidade sem enfrentarmos necessariamente a questão sobre um novo sistema ou um novo tipo de economia que produza os meios para viver para toda a população.
Jung Mo Sung - Professor de pós-graduação em Ciências da Religião |
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