Enquanto o governo se articula para conseguir aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, que congela os gastos públicos por 20 anos, os oposicionistas pretendem dedicar esta semana a um esforço concentrado para minar ou, ao menos, suspender a votação da matéria, que se tramitar dentro do prazo programado, será votada em primeiro turno no Senado no dia 28.
Está programado um seminário para discutir o texto com especialistas e vários representantes da sociedade civil, diversos discursos e atos nas comissões técnicas – inclusive a reapresentação de emenda que pede a realização de referendo sobre o assunto. Os parlamentares aguardam nos próximos dias, também, o anúncio da decisão sobre mandado de segurança apresentado ao Judiciário pedindo o cancelamento da PEC.
Como se tudo isso não bastasse, está em curso uma tentativa de obstrução das discussões sobre a proposta, no plenário do Senado. Uma vez que, conforme o regimento interno da casa, a votação só pode acontecer após cinco sessões para discussão da matéria. A duas primeiras foram realizadas na última semana. Qualquer atraso observado de 21 a 25 de novembro em relação às outras três sessões pode impossibilitar a votação final até 13 de dezembro. E, por tabela, a aprovação e realização das medidas de ajuste em conformidade com a Lei Orçamentária de 2017.
Em relação ao mandado de segurança interposto por três senadores oposicionistas ao Supremo Tribunal Federal (STF), os autores da iniciativa – Lindbergh Farias (PT-RJ), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) e Humberto Costa (PT-PE) – sabem que já foi interposta peça jurídica semelhante durante a votação do texto na Câmara. A diferença, desta vez, são os argumentos apresentados, que destoam da mera questão da inconstitucionalidade das medidas de ajuste do governo.
Os senadores argumentam, no mandado, que a PEC violará o princípio da separação dos Poderes, “já que o congelamento de investimentos públicos vai estrangular a independência e a autonomia financeira dos Poderes Legislativo e Judiciário; além do Ministério Público e Defensoria Pública” – destaca o texto. Também falam em violação ao princípio da vedação ao retrocesso social, ao justificarem que o corte dos recursos da saúde e educação “mitiga a essência protetora dos direitos sociais, reduzindo o número de cidadãos beneficiados pelas políticas do Estado”.
O mandado de segurança ainda repete itens apresentados na peça enviada ao STF por deputados anteriormente, como a violação ao princípio da segurança jurídica, da razoabilidade (por impor ao povo o ônus do congelamento, já que é a população mais pobre que depende dos serviços públicos de educação, saúde, previdência e assistência social) e fala em ilegalidade na tentativa, por parte de um governo que não foi eleito pelas urnas, de fazer mudanças que levarão a políticas de arrocho para a população.
“Além de todos os danos que representa a PEC ainda causará reparos imensuráveis às políticas sociais, que são reconhecidas na Constituição como direitos de cidadania”, afirmou Humberto Costa. O relator do mandado no STF é o ministro Luís Barroso, o mesmo que também relatou a peça jurídica sobre o tema encaminhado ao Supremo pelos deputados. Barroso, na ocasião, negou o pedido de suspensão da proposta.
É pouco provável que o ministro mude de ideia, mas diante de novos argumentos desta segunda peça jurídica e pelo fato de ser a repetição de um pedido, Luís Barroso pode vir a pedir para a decisão ser tomada pelo colegiado do tribunal, o que dará um período maior de tempo para discussão do tema e, ao mesmo tempo, representa suspensão da tramitação no Congresso – mesmo que provisória.
A possibilidade não se trata de especulação de integrantes do Judiciário, mas sim, esperança por parte de parlamentares. Na sexta-feira 18, deputados e senadores também demonstraram esperança de que o ministro possa pedir a suspensão da proposta, para julgar o mérito com mais calma.
Os senadores autores do mandado de segurança lembraram que durante duas décadas, ou cinco mandatos presidenciais, o país terá de ficar submetido à mesma política de arrocho “independentemente dos programas de governo a serem referendados por voto popular”, como destaca o texto jurídico. “Isso precisa ser levado em conta”, disse Vanessa Grazziotin, para quem Barroso pode mudar de posição.
Seminário na CFFC - Na Câmara, por sua vez, os deputados pretendem fazer coro ao trabalho dos senadores que são contrários às medidas impostas pela PEC, por meio de discursos e eventos diversos. O primeiro deles está marcado para esta segunda-feira 21, quando os integrantes da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle (CFFC) da Casa realizam seminário para avaliar o teor da proposta, no auditório Nereu Ramos.
Também cresce no Senado um movimento para fazer com que seja aprovada no plenário, durante a votação, emenda que pede a realização de um referendo após a apresentação da proposta, para que a população possa dizer se aprova ou não as medidas.
A emenda chegou a ser apresentada duas vezes na comissão que apreciou a PEC, pelas senadoras Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Vanessa Grazziotin, mas foi rejeitada no parecer do relator, o senador Eunício Oliveira (PMDB-CE). A intenção dos senadores oposicionistas é fazer com que, com base no convencimento dos que demonstraram dúvida em relação ao desgaste que o Congresso sofrerá com as medidas, conseguir votos suficientes para que a emenda seja encaminhada diretamente ao plenário da casa.
Várias frentes - Nesse ritmo frenético, a intenção dos oposicionistas é se reunir em várias frentes e atuar para conter o ímpeto do Executivo, que caminha em sentido oposto. Tanto é que o presidente Michel Temer já anunciou que o próximo jantar a oferecer no Palácio da Alvorada será para ministros dos tribunais superiores.
O jantar pode ser até ser visto como um gesto para conseguir apoio implícito dos magistrados à PEC, mas os parlamentares contrários à proposta sabem que as negociações e articulações de bastidores do Executivo passam por bem mais que isso e dizem respeito diretamente aos integrantes das bancadas partidárias.
É neste caminho que os oposicionistas pretendem agir, tentando conquistar os votos dos que ainda se dizem indecisos em relação à proposta ou, pior, preocupados com a reação popular diante da aprovação de medida tida como tão drástica.
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