A inspiração de Heitor Villa-Lobos na música tradicional e folclórica serviu de base para que, em 2000, o violonista e arranjador carioca Mario Adnet lançasse uma seleção de suas peças aos moldes de nossa música popular contemporânea, com violão, percussões e canto. Desta vez, ele percorre o caminho de volta, dando à obra de Villa-Lobos, ainda sobre essas bases de MPB, dimensão orquestral.
Só de olhar o set de instrumentistas que participam de "Um Olhar Sobre Villa-Lobos" (2013), novo projeto do violonista, imagina-se a qualidade do registro. Milton Nascimento, Edu Lobo, Mônica Salmaso, Paula Santoro, Muiza Adnet e o próprio Mario, revezando-se nas vozes. Na parte instrumental, figuras também da escola popular, como o violonista Yamandu Costa, o percussionista Armando Marçal, o flautista Teco Cardoso e o baixista cearense Jorge Helder se integram à orquestra de cordas do maestro Cláudio Cruz.
Do repertório do maestro, o disco inclui parte da série Bachianas, inspirada no folclore brasileiro e no estilo de J. S. Bach, choros, serestas e até macumba, em versões que incluem letras de Cacaso, Ferreira Gullar, Álvaro Moreyra, e Ribeiro Couto. Adnet, ainda que se furtando ao mérito, encontra um meio termo entre a música de feições erudita e a corrente já clássica da nossa música popular brasileira (como o próprio maestro se refere a Pixinguinha, Tom Jobim, Baden Pawell e companhia), diferente, por exemplo, das gravações com orquestras arregimentadas por Radamés Gnattali em tempos passados. Mais aproximado do que fez Gilberto Gil no ao vivo "Concerto de Cordas & Máquinas de Ritmo". "Um Olhar Sobre Villa-Lobos" (2013) sai pelo selo de Adnet, em parceria com o Borandá, incluindo 14 faixas e um belo encarte com letras, ficha técnica detalhada e fotografias das gravações. O disco é um dos finalistas da edição deste ano do "Prêmio da Música Brasileira" na categoria arranjador.
Músicas
No disco de 2000, "Villa-Lobos Coração Popular", o Adnet reuniu nomes como Guinga, Marcos Suzano, Zé Renato e Cláudio Nucci para dar uma interpretação enxuta, aos moldes do que se costumava gravar em discos de MPB. Os arranjos valorizavam o formato canção, sob base de percussões e violão, baixo, acordeom e, quando muito, um violoncelo.
O novo trabalho repete algumas do repertório anterior, mas com arranjos "revisados e ampliados". Músicas como "Estrela é Lua Nova", que em 2000, abria o disco com Guinga e Adnet nas vozes e violões e Marcos Suzano nas percussões, agora encerra, com violões de Yamandu e do próprio Mario, que também assume os vocais "O Villa é crossover. Ele pode ser tanto da sala de concerto como do jazz. O primeiro disco teve a proposta de dar um tom mais popular, de trazer para a música contemporânea brasileira (que não é mais popular, se você parar para pensar). Agora (no novo disco), já fiz sem nenhuma amarra, sem nada que me prendesse", detalha o arranjador.
"Estrela é Lua Nova" é exemplo ainda do contato originário da obra de Villa com a música popular tradicional. É baseada em um tema de domínio público, uma macumba registrada em 1919 sobre a qual o maestro assina a "ambientação". A música permanece, naturalmente, com um forte apelo à música popular, já tendo sido registrada anteriormente também em discos de Eliana Pittman (1969) e MPB-4 (1968).
Também do primeiro disco de Adnet, estão "Abril", com poesia de Ribeiro Couto; "Tristorosa", de Cacaso; "Realejo", de Alvaro Moreyra; e a instrumental "Caboclinha". O trabalho de adaptação dos arranjos concebidos de maneira erudita para o popular ficam claros em músicas como a "Dança (Martelo)", das série "Bachianas Brasileiras nº 5", onde o canto lírico dá lugar a voz Mônica Salmaso. Também ilustrando o caminho oposto, arranjos conhecidos de Edu Lobo para "O Trenzinho do Caipira", que ele lançou no disco "Camaleão" (1978) e aqui também a canta, ganham contornos menos comuns na MPB, com nove sopros, percussão piano, baixo acústico e a orquestra de 25 instrumentos de corda.
Projetos
Seria exagerado dizer que o trabalho de Adnet populariza Villa-Lobos. Mas, lança um novo olhar sobre a música do maestro. Nessa fusão de referências, apresenta um Villa-Lobos agradável aos admiradores de nossa clássica música popular, também ao público da música de câmara, sinfônica. O projeto foi apresentado no palco em São Paulo, com participação de grande orquestra. A quantidade de instrumentistas necessários dificulta, naturalmente, a circulação, embora, esteja nos planos do maestro. Por ora, ele anuncia que, em agosto, apresenta na Capital cearense o show da turnê "Jobim Jazz", com repertório de discos de 2007 e 2011 lançados com arranjos jazzísticos de canções de maestro da Bossa Nova.
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