Baseado em história de Will Smith e feito sob encomenda, "Depois da Terra" é um decente drama familiar
Desde que realizou "O Sexto Sentido" em 1999, M. Night Shyamalan, 42, tem se dedicado a levar as suas próprias ideias para o cinema. E tem se dado mal, ao ponto de perder a credibilidade junto aos estúdios de Hollywood após uma sequência de fracassos.
Afora "O Sexto Sentido", uma obra engenhosa sobre espíritos que continuam na Terra - a qual o levou a ser chamado de "gênio" e ele arrogantemente aceitou se postando como tal -, Shyamalan não conseguiu, a partir de então, fazer outro filme decente. Sem a mesma engenhosidade daquele, "Corpo Fechado" (2010), "Sinais" (2002), "A Vila" (22004), "A Dama da Água" (2006), "O Fim dos Tempos" (2008) e "O Último Mestre do Ar" formam uma fileira de obras de baixa qualidade.
Arrogante, Shyamalan sempre rejeitou a sugestão de recomeçar a carreira dirigindo os textos de outros autores e roteiristas. Como resultado, há anos sem filmar e vendo os seus projetos rejeitados pelos estúdios, o cineasta se tornou o caso do "gênio" destruído pelo próprio ego e a arrogância. Até Will Smith aparecer em sua vida.
Humilde, Smith pediu-lhe que dirigisse a adaptação da história que escrevera a partir da leitura de um artigo jornalístico sobre como pai e filho sobreviveram em uma selva após um acidente de avião. Smith pediu ainda a Shyamalan que o ajudasse nos ajustes do roteiro, já que a história tinha sido transportada para um enredo de ficção científica. Além disso, revelou que assumiria a produção, tendo o suporte da Sony Pictures no orçamento de US$ 130 milhões.
Lançado há uma semana nos EUA, "Depois da Terra" não obteve os iniciais aguardados US$ 40 milhões, obtendo apenas 27 milhões. Para este final de semana, os especialistas apontam que deverá obter um faturamento em torno de US$ 11 milhões. Quer dizer, "Depois da Terra" é um fracasso. Mas, há como explicar como um filme que tem Will Smith como autor, ator e produtor não despertou o interesse do público?
Há, sim. Primeiro, o preconceito. A expectativa negativa por uma parte da crítica, externada antes mesmo do filme entrar em circuito; e, segundo, o fato de ter sido vendido como uma ficção científica e não como destinado para a plateia infantil-adolescente, influíram diretamente. Mas há, ainda, outros problemas.
Após se ver "Depois da Terra", fica a percepção de outros detalhes que não são do filme, mas que estão no filme. A primeira delas é que "Depois da Terra" foi feito para Jaden, o filho de Will Smith, ser o novo astro-mirim-adolescente de Hollywood. Will trata de pavimentar a carreira do filho em um projeto pessoal, e, isso não é bem visto pela imprensa, conforme já li em comentários se referindo a corporativismo, nepotismo, etc. A segunda, é que se trata, originalmente, de um filme sobre e para a família. Para confirmar isso, basta seguir a história. Ou seja, ao trazer o filho para dentro do filme, Smith pai complicou o próprio investimento. Ou seja, despertou a ira de parte da crítica.
A história, por sua vez, não tem nada de mais relevante, não saindo do campo do existencialismo. Interessa, intrinsecamente, expressar o talento de Smith filho para a interpretação e o fato de ter uma compleição física perfeita para torná-lo um astro do cinema. Assim, "Depois da Terra" se torna alvo de dois tipos de preconceito: por um ser dirigido por Shyamalan e produzido por Will Smith para o filho.
Mas, tirando-se esses detalhes, interessa o filme em si. E começa com o enredo. No futuro, em tempo não citado, a Terra, palco de uma guerra mundial na qual as armas atômicas foram utilizadas, torna-se um planeta inabitável pela contaminação. A saída foi enviar parte da humanidade para um planeta idêntico: Nova Prime. Lá, um grande exército foi criado quando uma raça alienígena atacou e, desde então, os sobreviventes travam uma nova guerra.
O enredo de "Depois da Terra" se situa mil anos depois do homem ter abandonado o planeta e é o primeiro exemplar de uma trilogia pensada por Smith pai. Tem sentido. Mas, cá para nós, o filme e os aliens (que são cegos e se valem do olfato) lembram, e muito, outra ficção científica: "Tropas Estrelares" (Starship Troopers, 1997).
O personagem vivido por Will, Cypher Raige, é um militar durão. Por isso, o ator está sisudo durante todo o filme, o que afeta a sua interpretação, forçada. Ele é a expressão do Ranger tão destemido e invencível que é conhecido como "fantasma" e exige que o filho, Kitai (Jaden), seja aprovado nos testes para também ser um militar, o que não acontece. A mãe, Faia (Sophie Okonedo), pede ao marido para levá-lo em sua missão.
Nela, Kitai descobre que há um alienígena a bordo e, atingida por fragmentos de meteoros, a nave avariada cai na Terra, que agora é um lugar hostil para os seres humanos. Para o Kitai, é o início de uma jornada solitária por esse ex-lar do homem e para ele totalmente desconhecido, a fim de encontrar um local de onde possa enviar um sinal de socorro, tendo o alienígena em sua perseguição.
Obviamente a jornada do garoto é o tema central da produção, a transformação de um menino em homem. Assim, "Depois da Terra" não é nada mais do que um drama familiar desenvolvido em um enredo de ficção científica.
Shyamalan, trabalhando apenas como condutor de atores, não releva as particularidades do enredo, como as diversas questões envolvendo os homens e o planeta. Com isso, a recuperação da fauna e da flora do planeta ao seu estado primitivo passa quase batida. Curiosamente, "Depois da Terra" se torna um filme decente a partir de sua história simples. Há um caráter de real na história.
Outro problema do filme e que este o distancia do grande público é justamente a ausência de ação em sua primeira hora de duração. A má bilheteria nos EUA deve engavetar a ideia de uma trilogia. No entanto, o filme deve recuperar parte do prestígio de Shyamalan. Mesmo inferior a outras ficções científicas apocalípticas, como "Oblivion", "Depois da Terra", torna-se recomendável. Visto sem o olhar do preconceito, é um bom filme.
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