Graças aos mais recentes trabalhos, o artista foi selecionado para uma temporada em Buenos Aires
Com o olhar voltado para uma das características da sociedade contemporânea, o consumo, o artista visual cearense Eduardo Eloy - contemplado pelo Programa Internacional de Residências Artísticas da Fundacion Ace, de Buenos Aires, para onde segue no próximo dia 18 -, faz do lixo o ponto de partida para criar sua arte. Durante 28 dias, o artista continuará desenvolvendo a pesquisa denominada "Parque gráfico - diversão total", em solo argentino, retornando no dia 14 de setembro. Trata-se de convite que recebeu do Ministério das Relações Exteriores (MRE), explica Eduardo Eloy, completando que algumas das obras que farão parte de uma exposição, que marca o fim do programa, irão integrar o acervo do Itamaraty. No ateliê, o artista fala e faz demonstrações sobre o seu processo criativo. Mostra o saco com o lixo recolhido, enquanto explica sobre a construção das obras, sendo necessário o uso de pincéis, lápis, papéis, tintas coloridas, imaginação e informação.
Complexidade
As obras que integram a pesquisa artística "Parque gráfico - diversão total", iniciada há dois anos, parecem lúdicas à primeira vista, sobretudo pelo colorido. Mas, ao enveredar pelo universo criativo do pintor, gravador, desenhista e artista digital, o espectador percebe a complexidade da técnica, que mistura linguagens. A intenção de Eduardo Eloy é utilizar o lixo, considerado uma das principais marcas da sociedade de consumo, para propiciar múltiplas leituras da do mundo.
As interferências da realidade na sua obra não ficam restritas ao uso do material reciclável, fruto do desperdício. Podem estar ligadas às ciências naturais, à antropologia, ou simplesmente captadas no lixo industrial e caseiro. Não importa como ou onde começa o processo criativo.
O que conta mesmo é a sensibilidade do olho do artista, que faz do ateliê um espaço de reciclagem de ideias. Eloy transforma embalagens plásticas, caixas de leite, lixo digital, guardanapos de papel e até sandálias em pontos de referência para suas criações que compõem o projeto.
O desenvolvimento da pesquisa acontece em três momentos. O primeiro, denominado de recolhimento, consiste na busca dos materiais "para a apropriação de imagens num processo experimental e simbólico".
Ajuda
Conta com auxílio de um catador também, entrando mais um elemento na elaboração da obra que o artista chama de "aberta". Ela está sempre em processo de formação, assim como define a sua concepção de arte, que associa ao próprio movimento da vida. "Nossa arte está sempre em processo", reitera. Fala com entusiasmo de poder continuar o projeto em Buenos Aires, quando poderá coletar novos elementos. "Uso também jornais", disse, falando da interação entre as linguagens artísticas, bem como os meios utilizados.
Da mesa serigráfica artesanal, passando por uma copiadora digital, e ainda pelos lápis de cor, pincéis, tintas e rolos, o artista não esconde o entusiasmo ao falar sobre as possibilidades de usar sua arte para interferir na realidade. Seja pintando, desenhando ou reciclando o lixo doméstico ou que cata na rua. Na segunda parte do processo, os materiais recolhidos "se tornam suportes e condutores para novas imagens transformadas em obras artísticas, após serem trabalhadas com várias técnicas gráficas". Artista com formação em xilogravura, gravura em metal, litografia e processos gráficos digitais, desde cedo Eduardo Eloy demonstrou interesse pela arte.
Outro detalhe importante de sua obra, reconhecida nacionalmente, é a identificação com o Nordeste, daí afirma desde pequeno ter colecionado folhetos de Cordel. Mesmo morando no Rio de Janeiro, buscou manter essa relação com a cultura cearense e nordestina, citando a Feira de São Cristóvão, como exemplo desse elo. "O Ceará e o Nordeste sempre foram fontes de pesquisa para mim", revela, citando o tripé serra, mar e sertão. São elementos que servem de referência para a sua formação como artista. Entrando, claro, elementos urbanos e técnicas múltiplas, fazem de sua arte propostas visuais abertas a interpretações. "Ao juntar todo o processo, encontramos uma obra unificada, tornando sua leitura e seus códigos prontos para serem interpretados".
As obras de Eduardo Eloy, fruto da atual pesquisa artística, enchem os olhos dos espectadores e chamam a atenção tanto pelo colorido quanto pela técnica utilizada. Sem contar que funcionam como verdadeiros livros visuais, cujas mensagens podem ser decifradas ou apenas contempladas. "Sempre tive inquietação pela experimentação e em testar materiais", observa o artista, avisando que não existe um resultado final da obra. Em alguns momentos, remonta à brincadeira, fazendo jus ao título do projeto que faz referência à diversão total.
"Nossa vocação é procurar o melhor", diz o artista, estendendo a mensagem do programa à vida. "Procuro deixar meu trabalho em aberto para avançar". O processo de elaboração das obras começa com o recolhimento do lixo industrial, doméstico e digital. Em algumas criações, o próximo passo é a utilização da máquina de gravura, sendo impressos no suporte pontos serigráficos, que podem ser acrescidos com pinceladas, traços de lápis ou rolos. O resultado do processo são obras vivas, que parecem querer conversar com o espectador.
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