Krig-há, bandolo! Cuidado, vem aí Raul Seixas", que será lançado hoje, às 18h30, no Museu do Ceará
Pessoas que se reúnem em grupos da internet por um assunto em comum. Mais do que isso: marcam reuniões presenciais, catalogam informações, criam bandas, comercializam raridades. Essa era a pretensão da pesquisa da carioca Rosana da Câmara Teixeira, à época doutoranda em Antropologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro e já pesquisadora do tema idolatria desde o mestrado.
Raul de mil faces: uma mosca na sopa, uma metamorfose ambulante ou um cowboy fora da lei?
A pesquisa, no entanto, só se tornou realidade ao encontrar o nicho perfeito: os fãs do roqueiro Raul Seixas. Finalizado o trabalho, Rosana transformou a tese em livro, chamado "Krig-há, bandolo! Cuidado, vem aí Raul Seixas", que será lançado às 18h30, no Museu do Ceará; e continua com show da banda Renegados, no Terraço Bar, a partir das 22h.
Curiosamente, o caminho que levou Rosana a Raul Seixas começou no futebol. Durante o mestrado, investigava a idolatria dentro das torcidas organizadas. No entanto, para o doutorado, pretendia encontrar grupos de pessoas que se dedicassem a um ídolo e, no esporte, em geral, a torcida se volta para o time e não necessariamente para o jogador. Assim, chegou à música. "Meu interesse recaía sobre a identificação entre indivíduos: fã-ídolo. Com essas questões em mente, comecei a pensar em fazer incursões em outro universo. Seria igualmente efêmera a aura de um ídolo da música quanto parecia ocorrer no futebol?", questiona na introdução do livro. Foi quando encontrou o Raul Rock Club (RRC), fã-clube oficial do cantor e compositor "long seller", que ainda conquista milhares de seguidores, mesmo após 24 anos de sua morte.
Ao fim de janeiro de 2002, Rosana e Sylvio Passos, presidente do fã-clube, tiveram seu primeiro encontro, em São Paulo. Desde então, iniciou oficialmente sua pesquisa, entrevistando fãs, visitando comunidades virtuais e resgatando momentos marcantes da carreira do cantor, como a difusão das ideias da Sociedade Alternativa, fundada com Paulo Coelho, e a comoção dos fãs no momento de sua morte.
Mito
O título da obra é uma referência dupla: ao primeiro álbum solo de Raul Seixas, assim intitulado, que, aliás, completou 40 anos em 2013; e o grito de Tarzan, ensinado pelos macacos, que significava "Cuidado, aí vem o inimigo!".
A escolha foi sensata. O primeiro disco marca a chegada de uma estranha figura ao mercado fonográfico brasileiro - magro, cabeludo, tímido, gênio e "deslizante", como diria Rosana, "arredio aos rótulos". "Para o baixista Paulo César Barros, que o conheceu na CBS usando ´camisa social, calças jeans largas azuis, óculos de grau´, ´tímido ao extremo´, ´uma cabeça incrível´, foi um susto reencontrá-lo alguns meses depois com um visual completamente diferente", relata a autora em seu livro.
Paulo César Barros passa, então, a recordar o encontro com Raul em uma gravação na rádio Rio Branco. O roqueiro estava de roupa preta, bota, barba, óculos escuros e uma capa. O baixista questionou: "Que é isso cara, você pirou?". E Seixas respondeu: "Eu estou fazendo umas experiências comigo mesmo para ver até que ponto uma pessoa pode ser uma, duas ou três...".
A passagem é interessante para pensar o rumo que a obra da antropóloga toma. Observando a conduta dos fãs, Rosana registra as diferentes visões e versões que os seguidores têm de Raul Seixas, que, aparentemente, alcançou esta "multi-identidade" tão desejada. Alguns, se fiam ao roqueiro, o precursor de um rock de raiz; outros, ao revolucionário, de composições afiadas; e mais outros, ao mito, profeta, que mantém contato com discos voadores e funda uma nova possibilidade de vida em sociedade. Cada um assume para si o Raul que se quer.
"Essa possibilidade de entendê-lo de variados ângulos, lugares e perspectivas, de algum modo, parece lhe garantir a atualidade, a perenidade, já que a despeito de certos consensos, sua obra revela-se um campo de tensões" defende a autora, que acrescenta: "E a despeito de afirmar que ´entrar para a história é com vocês´, Raul Seixas, como metamorfose ambulante, mosca na sopa ou cowboy fora-da-lei, firmou-se como figura ímpar no cenário musical brasileiro e no imaginário de seus admiradores".
Renegados relança CD "Além dos rótulos"
Hoje, a continuação do lançamento do livro "Krig-há, bandolo! Cuidado, aí vem Raul Seixas", de Rosana da Câmara Teixeira, acontece no Terraço Bar, onde a banda Renegados faz show em homenagem a Raul Seixas e aos 40 anos do disco de estreia do cantor, lançado em junho de 1973. O evento conta com a parceria do Raulzito Rock Clube, fã-clube do roqueiro no Ceará, atuante há 23 anos.
Amanhã, dia 24, Renegados também faz show, mas dessa vez para relançar seu disco, intitulado "Além dos Rótulos", no anfiteatro do Cuca Che Guevara.
O projeto de relançamento foi contemplado no VIII Edital Secult Ceará de Incentivo às Artes, de 2011. O evento é gratuito e contará com a participação do guitarrista Felipe Cazaux.
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