O homem e a geografia do Ceará serviram de inspiração para o artista, destaque na mostra “Trajetórias”
Durante mais de um ano, entre setembro de 2003 e dezembro de 2004, o pintor cearense Raimundo Cela esteve presente nos corredores do Espaço Cultural Unifor, em exposição retrospectiva que levava seu nome e homenageava seu cinquentenário de morte.
O acervo reunia obras de diferentes momentos de sua carreira, provenientes de importantes instituições do País, como o Museu Nacional de Belas Artes e Museu Antônio Parreiras, no Rio de Janeiro, além de grandes coleções particulares.
Agora, o artista retorna à pauta do espaço, como parte da exposição “Trajetórias – A arte brasileira na Coleção Fundação Edson Queiroz”. Duas de suas telas, “Porto no Camocim” e “Praia no Camocim” (1939), integram o núcleo “A Invenção do Ceará”, ao lado de outros importantes nomes da terra, entre criadores expressivos da história das artes modernas no Estado – caso de Antonio Bandeira, Ademir Martins, Leonilson, Estrigas, Luiz Hermano, Heloisa Juaçaba e Francisco de Almeida. A curadoria da exposição é do crítico de arte Paulo Herkenhoff.
O universo litorâneo nordestino foi um dos temas mais trabalhados por Raimundo Cela, pelo qual ele é mais lembrado até hoje. Em seus quadros estão traduzidas as cores das praias, além de tipos humanos como rendeiras e pescadores – esses últimos, alvo de especial atenção do pintor, cujo cotidiano de labuta foi reproduzido com fidelidade.
Perfil
Nascido em 1890, em Sobral, ainda criança Cela muda-se com a família para Camocim, onde passa a infância. Em 1906 é mandado a Fortaleza para estudar no conceituado Liceu Cearense, onde se formou em Ciências e Letras.
Apenas quatro anos após chegar à capital cearense, Cela muda-se para o Rio de Janeiro (RJ). Lá, em sábia obediência à aptidão para as artes, matricula-se como aluno livre da Escola Nacional de Belas Artes (ENBA).
A influência da família, porém, não deixa de se fazer presente – o pai queria o filho engenheiro. Assim, ao mesmo tempo, Cela inscreve-se na Escola Politécnica. Três anos depois, recebe grau de engenheiro-geógrafo.
Em 1916 participa pela primeira vez do Salão da ENBA, no qual conquista a Pequena Medalha de prata. No ano seguinte, seu nome torna-se ainda mais reconhecido, ao ganhar o Prêmio de Viagem ao Estrangeiro, com a tela “O Último diálogo de Sócrates” – que lhe concedeu a oportunidade de viajar para a França a fim de complementar os estudos.
Permanece em Paris de 1917 e 1922. Na ocasião, estudou gravura em metal com o gravador inglês Frank Brangwyn. Por motivo de saúde que demandava maiores cuidados médicos, retorna ao Brasil, e escolhe a velha conhecida Camocim para fixar residência, junto à família. Lá, mantém-se trabalhando como engenheiro.
Redescoberta
À época afastado do circuito artístico, foi “redescoberto” pelo então funcionário público e também artista Mário Baratta, que instigou nos colegas da época a necessidade de se aproximarem e se organizarem para obter mais representatividade. A amizade entre os dois mantém-se até o fim da vida de Cela.
Em 1938, já em Fortaleza, Raimundo Cela cria um painel sobre a abolição da escravatura para o Palácio do Governo do Estado. Obtém, então, permissão governamental para utilizar o “foyer” do Theatro José de Alencar como ateliê, atraindo dezenas de pessoas curiosas por conhecer seu trabalho e processo de criação.
Em 1941, funda em Fortaleza o Centro Cultural de Belas Artes, mais tarde Sociedade Cearense de Artes Plásticas (SCAP), que contava com a participação dos artistas mais jovens.
Mas é apenas quando se muda para Niterói, no Rio de Janeiro, em meados da década de 1940, que decide retomar a carreira artística de maneira mais enfática.
Realiza a primeira mostra individual em 1945, no Museu Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro. Passa a lecionar gravura em metal na ENBA. Em sua produção, são temas constantes as paisagens, os tipos populares e o trabalho de vaqueiros e pescadores da terra natal. Destaque-se ainda sua obra gráfica, na qual retoma as mesmas temáticas. Falece em novembro de 1954.
Após sua morte, é criada a Casa Raimundo Cela, em Fortaleza, onde em 1970 ocorre uma mostra de artistas cearenses, com o lançamento de uma monografia sobre o artista. Em 2004, é lançado o livro “Raimundo Cela: 1890-1954”, de autoria de Estrigas, pela editora Pinakotheke.
Mais informações
Exposição “Trajetórias – A arte brasileira na Coleção Fundação Edson Queiroz”. Até 8 de dezembro, no Espaço Cultural Unifor (Av. Washington Soares, 1321). Visitação: de segunda a sexta-feira, das 8h às 20h; sábados e domingos, das 10h às 18h. Gratuito. Estacionamento no local. Contato: (85) 3477.3319
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