Na edição que comemorou os 20 anos do evento, o Grupo Bagaceira ganha o prêmio do júri popular do Festival de Guaramiranga com a peça A Mão na Face
O cartaz e seus traços já anunciavam a festa. A arte naif remetia à pureza que só é possível nos primeiros anos de vida. Para comemorar seus 20 anos, o Festival Nordestino de Teatro de Guaramiranga (FNT) procurou em sua história o mote; e, por toda parte, a memória foi a homenagem.
O festival aconteceu entre 7 e 14 de setembro, na cidade do Maciço de Baturité, a 109 km de Fortaleza. Com apresentações de 35 grupos e a participação de 300 artistas, o FNT se dividiu em seis mostras. A novidade foi a Mostra Ceará – FNT 20 anos que reuniu grupos que fazem parte da história do evento, em montagens como Flor de Obsessão, do Grupo Pesquisa, apresentada por ator Ricardo Guilherme em 1995 e que, este ano, fez parte da abertura do Festival.
A Mostra Nordeste, a principal do FNT, reuniu sete espetáculos do Ceará, Sergipe, Bahia e Paraíba. A vencedora da premiação do júri popular foi a peça A Mão na Face, do Grupo Bagaceira de Teatro, do Ceará, que se apresentou no penúltimo dia do FNT. O espetáculo, com texto de Rafael Martins, se passa em um camarim de um cabaré e mostra o diálogo, que oscila entre o patético e o comovente, entre a prostituta veterana Mara, interpretada por Marta Aurélia; e um jovem travesti de nome Gina, vivido por Démick Lopes.
Durante uma semana, Guaramiranga vê a arte do teatro se espalhar por vários recantos da cidade. E, por sete dias, respira artes cênicas. Do inusitado cachorro caramelo de nome Like que assiste aos espetáculos e late para o ator vestido de diabo em Conversa de Lavadeira, recriando a cena; ao encontro na fila de espera com Celsa Monteiro de Melo e Cryselide Moura, duas atrizes paraibanas de 83 e 80 anos que contam, com sabedoria e simplicidade, sobre os 50 anos de suas carreiras e no outro dia lhe tiram risadas com suas interpretações em Efémerico, da Cia Sírius. Ou ainda a história das crianças que exigirem que a mostra infantil, antes aberta ao público, também pedisse ingresso, como forma de se sentirem parte do festival.
Legado
Iniciado em 1993 já com caráter nordestino, o FNT, para Nilde Ferreira, diretora-geral do evento, ainda enfrenta dificuldades para ser vitrine para a produção nordestina. “Nosso curadores não conseguem chegar a todas as produções. Quando o artista consegue chegar aqui, ele consegue chegar várias vezes novamente. Mas até chegar a primeira vez é bem difícil”, avalia.
Outro empecilho para o festival é ter de, mais uma vez , pensar em outros espaços para a apresentação das peças. O Teatro Rachel de Queiroz (o “teatrão”), com espaço para 350 espectadores, continua interditado. Com isso, muitos espetáculos tiveram como palco o pátio da escola Professor Júlio Holanda, uma lona de circo montada na Arena FNT ou a Central de Artesanato.
“O teatro municipal foi criado para esse festival, mas nunca foi concluído e a cidade pequena não tem peso político para cobrar isso”, explica a diretora. A cargo da administração municipal, o restauro do Teatro é assunto delicado. “Há esforço por parte da Agua para que o teatro volte a servir ao seu propósito, mas isso é de responsabilidade da Prefeitura”, indica Renatta Lima, 26, diretora de produção do festival.
Ainda com traços de menina, a produtora relembra que começou no FNT aos 15 anos trabalhando como assistente, recepcionando convidados, entregando panfletos. “É uma relação de afeto com o festival, porque ele contribuiu para a formação pessoal de muitos de nós, fez com que desenvolvêssemos talentos”, relembra.
Como Renatta, existem muitos outros. Hoje, o festival acontece quase em sua totalidade comandado por pessoas de Guaramiranga que, ao longo da história do evento, formaram as habilidades necessárias. Para Nilde, diretora-geral do FNT, esse é “o principal legado”.
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