A família do poeta Vinicius de Moraes (1913-1980) proibiu a publicação de um livro da atriz e escritora Fernanda Quinderé sobre a obra do poetinha. O trabalho é um ensaio que analisa a fina ironia do músico cujo centenário foi comemorado este mês, no dia 19.
Vinicius cheio de graças, com 140 páginas, deveria sair pela Sonora, especializada em livros de música. A editora já havia assinado contrato com Quinderé, e a edição encontrava-se em estágio avançado quando a advogada da família, Maria Luiza Fernandes, comunicou que a obra não poderia circular. O livro está atualmente parado na editora.
O comunicado pegou a autora de surpresa. Enquanto pesquisava e escrevia, ela diz ter mantido contato com Fernandes pedindo carta de anuência. “Abriram a porta para eu falar com o (Luiz) Schwarcz (publisher da Companhia das Letras, que edita a obra de Vinicius)”. A editora não deu resposta, e a Sonora acabou topando o projeto.
Segundo Quinderé, uma das filhas do poeta, Georgiana de Moraes, foi incentivadora do livro. Quando esteve no Rio pela última vez, há cerca de um ano, a autora conversou com Georgiana, e ela lhe contou sobre o centenário do pai. “Eu disse que tinha vontade de fazer um trabalho retirando [dos livros] a ironia do Vinicius. Ela disse que era uma coisa legal e que ninguém tinha pensado ainda”, relembra.
A relação de Quinderé com Georgiana começou há 30 anos. As duas trabalharam juntas num espetáculo em comemoração aos 70 anos do escritor – que teve cinco filhos de nove casamentos, escreveu 13 livros de poesia e foi parceiro de figuras da música como Tom Jobim e Elis Regina.
Em Viva o Vina, a cantora Wanda Sá e Georgiana declamavam poesias de Vinicius enquanto o compositor Ronaldo Bôscoli, cunhado dele, recheava os textos com música. Vina era um dos apelidos familiares de Vinicius. “O espetáculo fez muito sucesso”, afirma Quinderé, que produziu e fez a pesquisa.
Desde essa época, ficou a proximidade com a literatura dele. Ao receber a negativa da família, ela afirma não ter questionado o motivo da recusa. Mas aventa hipóteses.
“Acho que não houve uma negociação comercial. Eles não disseram para mim: ‘Quanto nós vamos ganhar?’. E eu também, como não fui interpelada, não perguntei”, avalia. E acrescenta: “Os filhos formam um conselho que negocia a figura de Vinicius. Nada se faz sem autorização”.
Ela se refere à VM Cultural, criada em 1987. No site oficial do escritor, os filhos se afirmam “administradores da obra lítero-musical de Vinicius, assim como detentores dos direitos morais e patrimoniais”.
Em nota, a entidade alega que “teve um aconselhamento editorial contrário à publicação (de Quinderé), tanto da editora que publica a obra de Vinicius (a Companhia das Letras), como dos curadores da obra do poeta, em decisão pensada junto à família, que faz um trabalho criterioso da colocação da obra de Vinicius no mercado editorial”.
“Proibir não faz sentido no século XXI. Nunca fez sentido e agora que as coisas são mais claras menos ainda”.
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