O senhor de linguajar ágil abre a mão esquerda, recém-retirada do bolso da bermuda jeans, para mostrar, orgulhoso, as sementes de chichá que o acompanham na caminhada por entre as alamedas do Parque Ecológico Rio Branco. Os grãos marrons foram recolhidos pelo jornalista Ademir Costa, 61, cujo costume é, sempre que acha sementes do que quer que seja, recolhê-las e plantá-las em um pedacinho qualquer do Parque.
O plantio de novas árvores e o incentivo para que moradores do entorno do pedaço de verde ali no meio do bairro Joaquim Távora adotem cada um uma planta foram carinhosamente chamados de “Vejo Flores em Você” e é um dos projetos fomentados pelo Movimento Proparque, em que Ademir, o senhor que sempre carrega consigo as sementes, é gerente de documentação.
O Movimento - iniciado em 1995 por Ademir, a esposa Luísa Vaz, 57, e mais “dois ou três moradores do entorno” - está prestes a completar 18 anos de existência, na próxima sexta-feira. O aniversário será celebrado no domingo, dia 3, em uma das atividades do movimento, o Domingo no Parque – um piquenique que acontece no primeiro domingo de cada mês, com atividades familiares e apresentação de grupos musicais.
“Nós tínhamos acabado de chegar ao bairro e observamos o quanto a população tinha pouco apreço por esse local e como a prefeitura não tinha nenhuma ação aqui. Pra completar, no final de 94, colocaram uma placa ali na (rua) Castro Alves “Recebe-se entulho”. Aí começaram a chegar os caminhões. Olhe, tinha dia que a gente não conseguia contar”, relembra Luísa. A partir daí, Luísa e Ademir passaram a reclamar com os órgãos públicos - e também a denunciar nos jornais - sobre a situação de degradação do Parque. O que depois tornou-se uma ação conjunta com outros moradores.
Inicialmente, eles queriam a retirada dos entulhos, causa que nunca foi atendida. “O montante de entulho nunca foi retirado, hoje a vegetação já incorporou, e a gente só percebe um aclive de quase três metros”, relata Luísa. O caso foi apenas o estopim para a criação do movimento, que conta hoje com dez voluntários, que mantém atividades permanentes e recebem sempre novos membros, como Lenise Rebouças, 57, radialista aposentada, que há seis meses passou a contribuir com o grupo.
Conquistas
A história do Parque remonta a 1976, quando de um decreto para a desapropriação do local, assinado pelo então prefeito Evandro Ayres de Moura. O decreto caiu no esquecimento e só foi retomando em 1992, no mandato de Juracy Magalhães. Em 95, ano da criação do movimento, o Parque se resumia a uma pequena área, com pedriscos em uma trilha de caminhada, o entulho, as duas entradas, na Pontes Vieira e na Capitão Gustavo (hoje, há mais duas pequenas entradas na Castro Alves e na Visconde do Rio Branco), e a ocupação de famílias. “Foi o Proparque que lutou para muito do que existe aqui”, conta Ademir.
Hoje, a principal causa é regulamentação do Parque como área verde, sem que se permita a impermeabilização do solo local. “Isso, pra gente, é uma questão de honra: não permitir mais nenhuma construção aqui dentro. O parque já é uma ilha nesse mundo de construção, é uma ‘nesguinha’ de verde que restou dos séculos de expansão de Fortaleza. Nós não queremos perder isso”, sentencia Ademir.
Quem passa ali na avenida Pontes Vieira, no ruge-ruge da cidade, talvez não perceba a dimensão do Parque. O Rio Branco tem uma área de quase oito hectares, uma nascente e um riacho, um sem fim de castanholeiras, goiabeiras, coqueiros, mangueiras e oitizeiros, uma trilha com 930 metros para caminhadas e equipamentos de musculação, além de espaço de recreação infantil.
Saiba mais
O Parque em detalhes
- O Movimento Proparque detém cópia do Diário Oficial de 1976 em que ficava decretado a desapropriação dos terrenos na área. Este é o primeiro documento do Parque de que se tem notícia.
- O prefeito Juracy Magalhães retomou a delimitação do projeto do Parque em 1992 com base em um estudo da Empresa Municipal de Limpeza e Urbanização (Emlurb).
- Segundo o Proparque até hoje, 21 anos depois, há áreas do decreto de 92 que não foram desapropriadas e o Parque ainda não foi regulamentado.
- Atualmente, o movimento estima que o Parque tenha uma área de oito hectares, cortados pelo Riacho Rio Branco, além de 930 metros de trilhas de caminhadas e equipamentos para musculação.
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