Depois de uma fase crítica e de pouco público, centro cultural recupera vitalidade de seu espaço exibidor
Três meses após sua reabertura, o cinema do Dragão do Mar - atual cinema Dragão-Fundação - contabiliza números bem positivos. Foram 11.242 ingressos vendidos apenas na programação regular, referentes a 49 longas exibidos em 489 sessões.
Três dramas se destacaram como sucessos de público desta nova fase do cinema no Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura: "Azul é a Cor Mais Quente", o pernambucano "Tatuagem" e "Um Estranho no Lago"; abaixo, cenas do filme nacional
Se somado ao público presente nos dois festivais recebidos pelo equipamento - Cine Ceará e For Rainbow - o resultado passa de 15 mil espectadores e mais de 70 filmes.
O balanço foi divulgado pelos atuais curadores do espaço, Pedro Azevedo e Salomão Santana. Junto ao cineasta Kléber Mendonça Filho e ao crítico Luiz Joaquim (responsáveis pela programação da Fundação Joaquim Nabuco, entidade pernambucana parceira do cinema do Dragão) - eles determinam a programação das duas salas.
"Tudo é pensado a quatro cabeças, mantemos um diálogo constante com eles. O Kléber está na Fundação desde 1998; o Luiz, desde os anos 2000. Eles entendem muito da coisa, sempre recorremos aos dois para ter certeza das ações", explica Pedro Azevedo.
Até 2012, o equipamento era denominado Espaço Unibanco Dragão do Mar, gerido pelo Espaço Unibanco de Cinema. Em abril daquele ano, a parceria foi desfeita por iniciativa do grupo empresarial. No mesmo mês, o empresário e escritor João Soares Neto foi procurado pela direção do Instituto de Arte e Cultura do Ceará (IACC) para assumir temporariamente o espaço.
Durante quatro meses, Soares administrou as salas com a experiência que já trazia do cinema no Shopping Benfica, do qual é proprietário. Uma pequena reforma nas antessalas (onde se localizavam as bonbonnières) chegou a ser realizada.
Após novo período de indefinição, finalmente foi anunciada a parceria com a Fundação Joaquim Nabuco, em agosto de 2013. As duas salas permaneceram fechadas para a realização de uma grande reforma, prevista na reestruturação anunciada para o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura (CDMAC) e que incluiu aumento do número de lugares, novos assentos e compra de equipamentos mais modernos de som e projeção, além de instalação de cafés Santa Clara nas antessalas.
"Quando o Instituto Dragão do Mar fechou o acordo de colaboração técnica e curatorial com a Fundação, o Kléber e o Luiz passaram a procurar nomes em Fortaleza para assumirem a curadoria adjunta", lembra Pedro. "Eles buscavam pessoas jovens que tivessem perfil mais ou menos parecido com aquilo que buscam para a Fundação".
Segundo Pedro, o nome de Salomão Santana já tinha sido levantado há algum tempo, pela atuação significativa do jovem cineasta no cenário da produção audiovisual cearense. "Nós fomos indicados pelo Kléber à diretoria do IACC e passamos por uma seleção, com prova escrita e entrevista", conta o jovem de 20 anos, estudante de Psicologia.
"Em Fortaleza temos iniciativas importantes como o Cinema de Arte (realizado no UCI Ribeiro Fortaleza, no shopping Iguatemi), mas o cinema Dragão-Fundação é um dos primeiros espaços na cidade pensado com esse pensamento curatorial", ressalta Pedro.
Segundo ele, paralelamente à vontade de trazer produções nacionais e do Ceará ("onde há uma produção grande"), é necessário pensar em uma programação que "seduza o público, tanto o que já comparecia quanto um novo. É preciso fazer as pessoas entenderem que se trata de um espaço aberto à cidade, não restrito a determinado nicho cinéfilo", pondera o curador.
"Acima de tudo, estamos tentando quebrar o paradigma de que o cinema do Dragão é ´cinema de arte´", complementa. Para o curador, blockbusters ou filmes de apelo mais comercial são uma das formas dessa linguagem audiovisual, mas não a única. "É importante que o público descubra outras possibilidades", observa.
Público
No processo de idealizar a programação das salas, Pedro diz que os quatro responsáveis ponderam quais filmes são interessantes de trazer e quais não são. "É necessário criar no nas pessoas o hábito de ir às salas, por isso precisamos de filmes que sejam bons e fortes. A seleção, muitas vezes, foge ao gosto pessoal. Há filmes premiados que precisamos trazer. Outros são extremamente radicais, só agradariam a um público restrito", avalia.
Nesse processo, a relação com distribuidoras revela-se frutífera, mas não isenta de momentos delicados. "Na maioria das vezes as propostas dão certo, até porque não há muitos outros espaços para elas exibirem esses filmes aqui", frisa.
"Mas existem distribuidoras que querem impor seus filmes. Por exemplo, se solicitamos um título, elas atrelam a disponibilização à exibição de outros (do catálogo). É um tipo de barganha que não funciona, porque não queremos tratar filmes como unidade de medida. Não estamos cumprindo cotas", critica.
Ainda assim, Pedro mantém uma análise positiva do atual circuito "alternativo" de cinema no País. "Está muito bom, temos distribuidoras antigas como a Imovision, e novas, como a Vitrine, a Estação Filmes, que apostam no cinema nacional. É um circuito que sempre foi forte no Sudeste e agora temos espaços para ele", comemora.
Planos
Além de questões curatoriais, para o jovem, a boa resposta do público à reabertura do cinema Dragão-Fundação deve-se também ao cuidado com a qualidade de projeção e de som. "Quando o espaço ainda estavam em reforma, fomos a Recife pra conhecer a parte técnica das salas da Fundação, referência na área. As estruturas ficaram bem parecidas. Isso é importante porque em Fortaleza temos os sentidos um pouco acostumados com projeção ruim", alfineta
"Quando vi pela primeira vez uma sessão com equipamento 4K (que oferece resolução de imagem quatro vezes superior à tradicional) foi emocionante", conta. Então acho que as duas coisas, quando unidas, contribuem para fazer um bom trabalho", complementa.
Oficialmente, Pedro e Salomão permanecem na curadoria até agosto deste ano. Já a parceria com a Fundação Joaquim Nabuco está assegurada até 2015. Entre os planos, está o de investir mais no espaço físico do cinema. "Queremos colocar displays para os cartazes e uma estante para venda de filmes cearenses (curtas e longas) em DVD e Blu-Ray", adianta Salomão.
Em termos curatoriais, há a vontade de trabalhar mais intensamente com realizadores locais. "Atividades de formação também estão na nossa pauta", conta.
Para o fim de janeiro, a dupla planeja uma mostra de férias, com cerca de 15 longas inéditos em Fortaleza. "A relação com Luiz Joaquim e Kleber Mendonça Filho é muito enriquecedora. Nossos contatos são permanentes e estamos pensando em ações conjuntas. É incrível perceber que o público frequentador está curioso com os próximos passos e ter esse retorno nos dá mais vontade de trabalhar", celebra Salomão.
Para Pedro, o mais importante é que o equipamento vire um ambiente de encontro e de reflexão sobre cinema na cidade. "Queremos que as pessoas frequentem, encontrem-se antes e depois dos filmes, conversem sobre eles", resume. Está ainda na lista de objetivos dos curadores exibir filmes clássicos restaurados em formato digital e de 35mm.
Mais informações:
Cinema Dragão-Fundação
R. Dragão do Mar, 81, Praia de Iracema. Programação em facebook.com/cinemadodragao e dragaodomar.org.br
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