Vestimentas e registros históricos mostra mas transformações e permanências do Maracatu no Ceará
Com a aproximação do Carnaval, Fortaleza começa a se preparar para mais um ciclo de festas e brincadeiras tipicamente brasileiras. O período também é marcado, na Capital, pela apresentações de grupos de maracatus, que vão além da folia e buscam com o toque dos tambores e a entoação dos loas uma afirmação cultural daqueles que participam da manifestação.
Buscando aprofundar uma reflexão acerca dos cortejos no Estado, será aberta hoje a exposição "Maracatus no Ceará: Festa, Ritual e Memória", no Estoril, às 17 horas. A mostra esboça um panorama histórico através de registros e peças utilizadas por personagens marcantes da festa em Fortaleza.
Um dos personagens representados nos adereços utilizados em cortejos é Mestre Juca do Balaio. Nomeado Mestre da Cultura pela Secretária de Cultura (Secult), em 2003, Juca participou de sessões fotográficas para o calendário oficial da pasta de cultura estadual. A saia utilizada durante esse ensaio é uma das peças que integram a exposição. Mestre Juca do Balaio desfilou entre as décadas de 1970 e 2000 no Maracatu Az de Ouro, agremiação mais antiga em atividade no Ceará, e era conhecido pela habilidade de desfilar com o adereço que lhe dá sobrenome sobre a cabeça.
Outra figura marcante representada na exposição é Zé Rainha, que desfilou por diversos maracatus, mas se destacou nos cortejos do Az de Ouro. Ele foi uma das rainhas mais famosas e marcantes da manifestação cultural em Fortaleza, ganhando diversos títulos por sua performance, e responsável pela incrementação da coroa do personagem através de brilhos, pedras e paetês. A participação de Zé como rainha fazia parte de um contexto social e histórico em que homens assumiam os papéis das mulheres em manifestações culturais.
"Durante as décadas de 1930 e 1940, as mulheres eram proibidas de participar do Carnaval como brincantes", afirma Danielle Maia, doutora em Sociologia, curadora da exposição e autora do livro "Maracatus no Ceará: sentidos e significados", editado pela Universidade Federal do Ceará. Assim, as atividades delas se resumiam à confecção das fantasias e a preparação das bebidas e comidas, segundo a pesquisadora. Cabia aos homens a tarefa de se travestir para participar dos cortejos. A primeira mulher Rainha de Maracatu foi coroada em 1987.
Memória
De uma manifestação de afirmação cultural de grupos negros à uma prática integrante do carnaval, a exposição busca traçar uma linha de tempo em que evidencia as mudanças sofridas com o passar do anos nos cortejos na Capital. Esse trabalho é realizado através de publicações, fotografias, vídeos e gravações.
"Os primeiros registros de Maracatu no Ceará remontam ao final do século XIX e estão presentes na obra do jornalista Gustavo Barroso, que através de suas memórias de infância, relata desfiles no Carnaval", explica Danielle Maia. O marco da relação da manifestação cultural e o Carnaval acontece com a criação do Az de Ouro, em 1936, que no ano seguinte desfila na festa de rua à convite do Rei Momo da época. "Desde então, o Maracatu foi se legitimando como uma prática carnavalesca", afirma a pesquisadora.
Apesar de ainda ser uma atividade ligada ao período carnavalesco, a ponto de ser o ponto alto das atividades de grupos no Ceará, a programação dos atores da manifestação cultural se sobressai em diferentes momentos do ano.
Sonoridade
Os registros sonoros disponíveis na exposição ainda convidam o visitante a repensar a sonoridade do Maracatu. Gravados em 1943 pelo cearense Raimundo Alves Feitosa e pelo carioca Luis Heitor Correia, as gravações são os únicos registros de maracatus realizados antes da década de 1950.
"(As gravações) dessa dupla mostram como era a sonoridade naquela época. Podemos notar uma diversidade de ritmos, diferente daquele que é visto como tradicional", ressalta Danielle. A diferença a que se refere a pesquisadora é em relação a cadência do Maracatu, eminentemente lenta.
"Esses registros são importante para pensar a diversidade sonora que atravessou a história do Maracatu no Ceará. Essa sonoridade dita tradicional vai se tornar preponderante a partir da década de 1970", diz a pesquisadora.
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