A pesquisa e a experimentação constituem as principais características do Teatro Máquina, grupo criado em 2003, por jovens que tinham um desejo em comum: mergulhar no universo das artes cênicas, mas na perspectiva de estudar e propor novas linguagens e exercícios. Numa demonstração de que o fazer teatral é um constante desafio, os seis atores que compõem, hoje, a companhia festejam os 10 anos de carreira, em grande estilo, encenando os espetáculos "Ivanov" e "João Botão", no teatro da Caixa Cultural Fortaleza.
A estreia de uma das primeiras peças do dramaturgo e escritor russo Anton Tchecov (1860-1904), acontece nesta quinta, 13, às 20h, prosseguindo até sábado, 15. No domingo, às 17h, o grupo sobe ao palco para encenar "João Botão", baseado no livro "Jim Knopf e Lucas, o Maquinista", do escritor alemão Michael Ende. Após a apresentação da peça, único trabalho infantil do grupo, das das 18 às 19h, será lançada publicação "Caderno Teatro Máquina 2003-2013", que traz textos, jogos e exercícios, destinados a professores e atores.
A temporada faz parte do projeto "Caixa Teatro Máquina", que teve edital aprovado no ano passado, mas que só agora foi possível ser materializado, explica Fran Teixeira, diretora do grupo. O espetáculo "Ivanov" estreou em 2011, enquanto que "João Botão" foi concebido em 2004, a partir de uma leitura dramática do livro de Michael Ende, estreando em 2010. De quinta até sábado, o público de Fortaleza poderá sentir a atmosfera da Rússia do fim do século XIX, antes da revolução. O clima de convulsão social pela qual passava o povo russo é simbolizada na angústia de um homem, Nicolas Ivanov, vivido pelo ator Edivaldo Batista, contextualiza Levy Mota, ator e produtor do espetáculo, que tem duração de 1h10m.
Escrita em 1887, "a peça fala de um homem em crise", resume o ator, esclarecendo que, como se não bastasse o contexto de turbulência social, política e financeira em que estava mergulhado, sua vida pessoal também é afetada. Sua mulher encontrava-se doente de tuberculose, doença terminal, naquela época. Justamente por tratar da subjetividade do ser humano, o espetáculo torna-se contemporâneo, uma vez que "a crise existencial é algo universal". Levy Mota esclarece que a peça rememora a Rússia do fim do século XIX, que se mistura com figurinos contemporâneos. "Não coloca o espectador em um tempo específico", argumenta, justificando algumas adaptações, como por exemplo, na linguagem e nas roupas. Mas tudo de maneira sutil, ressalvando que a peça procura respeitar o texto original.
Do drama russo ao infantil alemão
Anton Tchecov é considerado um autor de referência para o teatro mundial, sendo suas obras usadas por grupos que enfatizam a experimentação, como é o caso do Teatro Máquina. Levy Mota chama a atenção para a importância do trabalho do ator, "fazendo com que o público fique bem próximo da cena", sendo criado um clima intimista, bem real.
A diretora Fran Teixeira revela que foi necessário a realização de pesquisa para a adaptação do texto. "Investigamos possibilidades de inserções épicas dentro do realismo, sendo improvisadas dança e música".
As imagens dos atores aparecem na peça quase como fotografias, afirma, fazendo relação ao tempo e ao espaço. "É importante revisitar a obra de Tchecov", admite Fran Teixeira, considerando um desafio para os grupos que trabalham com experimentação investigar sobre o fazer teatral e as novas linguagens. Obras clássicas, a exemplo de Ivanov proporcionam esse exercício. A pesquisa e a montagem do espetáculo contaram com apoio financeiro do programa Eletrobras de Cultura através da Companhia Hidroelétrica do São Francisco (Chesf).
Durante a pesquisa, o grupo realizou viagens para os municípios de Arneiroz e Russas, bem como para João Pessoa, com a finalidade de trocar experiências. "É motivo de alegria fazer uma temporada, embora curta, em Fortaleza", comenta Fran Teixeira, fazendo referência ao projeto "Caixa Teatro Máquina", fruto de edital aprovado, em 2013. Nesses anos de estrada, o grupo tem viajado muito, participado de festivais Brasil afora, além de ter ganho sede própria.
Levy Mota conta que o Teatro Máquina foi criado pela iniciativa de Fran Teixeira, na época, retornava de São Paulo, após concluir mestrado em teatro, e "procurava colocar em prática seus conhecimentos".
O contato com os primeiros integrantes do grupo aconteceu por ocasião do festival de talentos com alunos de escolas públicas, do qual Fran Teixeira participou do júri. "Eram todos jovens na faixa de 15 e 16 anos", diz, completando que foi assim que nasceu o Grupo Máquina.
Infantil
O embrião para o único espetáculo infantil do grupo começou a ser gestado em 2004, quando os atores foram convidados para realizar uma leitura dramática do livro de Michael Ende: "Jim Knopf e Lucas, o Maquinista", durante a Bienal do Livro do Ceará.
A encenação da obra marcava o lançamento da primeira tradução da obra no Brasil. "João Botão" é uma adaptação do romance de literatura fantástica, que teve, inicialmente, duração de 20 minutos. Depois, foi transformado para uma peça de teatro. "Foram escritas novas falas", revela.
O espetáculo consiste em mostrar a capacidade de adaptação do ser humano, tomando como ponto de partida o mesmo argumento usado pelo autor alemão.
Ou seja, o espetáculo tenta reproduzir no palco a ilha pequena que só comportava quatro pessoas. No entanto, os moradores são surpreendidos com a chegada de uma caixa, que tem como conteúdo um bebê. Encantados com o presente, os moradores não lembraram de que a criança iria crescer, precisando, assim, ocupar um espaço que, na realidade, não existia. "Com isso a gente quer falar sobre a organização do espaço público", diz Levy Mota.
Os atores ocupam um espaço delimitado de dois metros por três, no palco, a fim de reproduzir a pequenina ilha, imaginada por Michael Ende.
O espetáculo tem um formato diferente do teatro infantil convencional, dispensando os grandes cenários. Durante 40 minutos, atores e crianças dividirão um ambiente minúsculo, sendo possível a participação nos diálogos e o olho no olho. "Acredito que os adultos também irão gostar muito", aposta Fran Teixeira, que assina um espetáculo que trata sobre assuntos sérios, mas na dimensão da brincadeira. Os atores pegaram apenas o mote do livro, ou seja, buscaram inspiração no autor alemão, mas criaram dramaturgia própria. O espetáculo foi desenvolvido em 2010 e sua "construção se dá a partir do público". Sobre o lançamento do "Caderno Teatro Máquina 2003-2013", Fran Teixeira diz que se destina ao público de teatro como professores e atores. A obra consta de textos, jogos, exercícios, e a publicação contou apoio do Banco do Nordeste do Brasil (BNB). Integram o Teatro Máquina: Ana Luíza Rios, Edivaldo Batista, Fran Teixeira, Levy Mota, Loreta Dialla e Márcio Medeiros.
Mais informações:
Projeto "Caixa Teatro Máquina" com a apresentação dos espetáculos "Ivanov", nos dias 13, 14 e 15, às 20h; e "João Botão", dia 16, às 17h. No domingo, às 19h, acontece o lançamento da publicação "Caderno Teatro Máquina 2003-2013", no Teatro da Caixa Cultural, Av. Pessoa Anta, 287 - Praia de Iracema. Ingressos: R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (meia).
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